Sobre livro e biblioteca, por Luiz Hugo Burin
Assessoria: Farrapo
19/08/2024 15:34:59

As histórias sobre os livros são longas. Envolvem ciências e enredos infinitos de amor e ódio. Na Idade Média, despertou reflexões da antiguidade clássica que se chocavam com dogmas e a fé cristã. Uma das crenças difundidas pelos poderosos do alto clero era a de que o riso, a diversão e a comédia desvirtuavam a sociedade, tirando o foco da espiritualidade. Assim, não era recomendado que os religiosos rissem. Aí proibiram uma obra de Aristóteles que versava justamente sobre o riso.

Nessa trajetória, também temos fatos curiosos e bastante comuns. Não é raro encontrar livros ocupando lugar de destaque em prateleiras bonitas e envidraçadas, com a função de ornamento. O escritor João Simões Lopes Neto, num de seus textos do final do século XIX, cita os livros de um Barão, doutor, seu vizinho: “Os livros, naquela casa enorme, ninguém os pode ler! Estão lá em pé, chaveados e adormecidos, apenas estando, para deixar a sala mais bonita”.

Também temos exemplos que devotam ao livro proteção e amor imensuráveis.

Em Paris, uma biblioteca mostra uma fachada aparentemente modesta, com dois andares. Ledo engano: é um bunker para livros. Pergentino Pivatto, meu professor da PUCRS pesquisou lá. No pós-doutorado, encontrou naquele endereço o livro que precisava. Pagou a taxa antecipadamente e lá compareceu no dia agendado. O limite máximo da pesquisa era de uma hora. Ao chegar, identificado, receberá máscara e luvas. Desceu sete andares abaixo do nível da rua acompanhado de um funcionário. Disse não saber quantos andares mais havia abaixo.

Conduzido à pequena sala onde havia mesa e cadeira, o funcionário chegou carregando uma pequena caixa. Tomou a chave e abriu aquela espécie de cofre. Dentro, o livro envolto em tecido especial. Com uma pinça, abriu na página solicitada. Sobre o livro aberto, fora colocada uma lâmina de vidro transparente, para evitar que a respiração ou a saliva pudesse comprometer a saúde das folhas. Necessitando virar a página, somente o funcionário podia fazê-lo. A cada quinze minutos a pesquisa era interrompida. Funcionários e pesquisador acoplavam máscara com oxigênio sobre o rosto para respirar. Esses procedimentos eram obrigatórios, pois o ambiente era altamente tóxico. Depois, a pesquisa prosseguia.

Esse relato do professor impressionou muito. Aquela biblioteca de Paris pertence a uma ordem religiosa. As bibliotecas monásticas foram praticamente as únicas a preservar os livros ao longo da história. Foram quase que exclusivamente elas as guardiãs dos acervos remanescentes do conhecimento registrado através da escrita. Naquela biblioteca, o livro recebe alto padrão de excelência e respeito à cultura. Sua estrutura fora construída após a Segunda Guerra Mundial. Uma forma de preservação ostensiva dos futuros olhares famintos das ações desastrosas da violência e do autoritarismo. Verdadeira fortificação subterrânea construída para a guardar livros. A fúria dos combates nunca antes vistos, haviam mostrado seu poder de destruição. No cenário da guerra, milhões de livros sucumbiram junto à vida de todas as espécies sob a inclemência dos bombardeios.

Aquela unidade de Paris evita propaganda que venha despertar cobiças. O acervo principal compõe-se de livros recolhidos de antigos mosteiros religiosos, pois o poder político constituído, ao longo da história, pouca relevância deu a este mister.   

Apesar dos percalços, o livro é um vencedor. Resiste bravamente driblando insônias e é medalhas de ouro na modalidade ‘Boa companhia’.  

 

Luiz Hugo Burin

 

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